KURPU DI MUNDU | Work in Progress
“Acreditar no mundo e na vida é acreditar no corpo”
José Gil e Ana Godinho
Em contraste com os movimentos mecânicos, mas caóticos e violentos, das sociedades humanas, a dança sintoniza-nos com a nossa realidade biológica, complexa e poética. A dança aproxima-nos do natural, do animal e do espiritual.
No movimento de um corpo que dança extravasa-se a dor e sublima-se o prazer, e encontra-se um sentido mais profundo a partir do qual se lê a existência.
Mergulhando na ancestralidade e na força vibrante da terra e da gente da Guiné-Bissau, explora-se o corpo enquanto veículo de afinação com o mistério de uma força ligada à natureza, e a esse corpo maior que é o mundo: a floresta enquanto lugar poético de onde viemos e ao qual pertencemos.
Dando continuidade à estética desenvolvida por Pedro Ramos, que explora o corpo como parte da floresta, a ecologia profunda e a alquimia, e abraçando, em cocriação, a linguagem coreográfica de Ernesto Nambera, coreógrafo do Ballet Nacional da Guiné-Bissau e do Grupo de Dança Contemporânea da Guiné-Bissau, que integra numa estética contemporânea a enorme riqueza expressiva e saber ancestrais, procura-se criar uma peça que, indagando sobre as problemáticas ecológica, sociais e políticas do nosso tempo, procure no restabelecimento dos laços de confiança e de afinação com a natureza, exterior e interior, um caminho de transformação e de ressignificação da nossa vivência comum.
Procura-se, no saber do corpo, um ritual de encontro e autoconhecimento, onde a descoberta das individualidade e singularidade de cada um possa coabitar com a procura de uma identidade colectiva e de irmandade com a vida-mais-que-humana. Entre a ancestralidade e a contemporaneidade, a experiência holística do corpo e as preocupações emergentes dos dias de hoje, procura-se a afinação com as nossas realidades biológica e espiritual, alinhadas com o sentimento de pertença e ligação à terra. A partir de um conjunto de residências artísticas entre a Guiné-Bissau e Portugal, da relação criativa entre os coreógrafos Ernesto Nambera e Pedro Ramos, do intercâmbio entre bailarinos colaboradores da Ordem do O e do Ballet Nacional/Grupo de Dança Contemporânea da Guiné-Bissau, pretende-se reflectir sobre algumas das problemáticas do estado do mundo a nível político, social e ambiental, mas também sobre o potencial da dança e do corpo para despertar reflexão sobre e conhecimento de outros possíveis sentidos e significados para a convivência com o outro e com o planeta.